Júlio Barbosa de Aquino

Júlio Barbosa de Aquino: Presidente do CNS (1989–1992/2019–2023)

Nascido e criado no Seringal Dois Irmãos, morador da Colocação República, no coração da Reserva Extrativista Chico Mendes, o seringueiro Júlio Barbosa vem de uma família grande, de doze irmãos (quatro mulheres e oito homens). Casado com Leide Aquino, Júlio é pai da Yara e avô da Mariah, do Diogo, do Júlio e do Mateo.

Ao acompanhar o pai na extração do látex das seringueiras nas matas de Xapuri desde os 10 anos de idade, aos 14 começou, ele mesmo, a cortar seringa, e assim o menino Júlio foi aprendendo, junto com os segredos da floresta, o significado de ser seringueiro: levar uma vida de muito trabalho e grandes privações dos bens de consumo urbano.

Porém, se muitas das vezes não havia um sapato para calçar, a mãe-floresta nunca deixou que lhe faltasse o leite da castanha, o açaí com farinha, a carne da caça, o ingá e toda a abundância que fez do menino-seringueiro sobrevivente de cinco malárias um homem forte e resistente, capaz de enfrentar as muitas adversidades surgidas ao longo de sua caminhada nos varadouros da vida.

Fruto, segundo ele mesmo, de uma longa jornada de resistência contra a opressão de seu povo, Júlio iniciou sua militância social por meio das comunidades eclesiais de base da igreja católica, em plena ditadura militar, aos 22 anos de idade.

Desde então, nunca mais parou. Atendendo ao chamado de seu amigo Chico Mendes (seu padrinho de casamento com Leide), na década de 1970 Júlio foi para a linha de frente dos empates, em um esforço coletivo de resistência ao desmatamento das fl orestas por fazendeiros vindos do sul do país para, em seu lugar, instalar nas terras do Acre grandes fazendas de pecuária.

Em 1977 participou da fundação, junto com Chico Mendes e seus companheiros, do Sindicato dos Trabalhadores (e das Trabalhadoras) Rurais de Xapuri, espaço de luta que serviu e ainda serve de esteio para a luta em defesa da Amazônia e base para a sonhada igualdade social.

Em 1985, participou, em Brasília, do I Encontro Nacional dos Seringueiros e do lançamento, pela voz de Chico Mendes, da proposta de Reserva Extrativistas e da criação do Conselho Nacional dos Seringueiros (CNS).

Em dezembro de 1988, quando Chico Mendes foi assassinado com um tiro de escopeta, disparado por um pistoleiro a mando do latifúndio, mesmo sentindo que foi colocado sobre seus ombros o peso de muitas “pelas de borracha” (cada uma pesava entre 50 e 60 quilos, segundo o agrônomo e advogado Gomercindo Rodrigues), Júlio assumiu, sem titubear, a presidência do Sindicato.

Em 1989, o líder acreano assumiu, pela primeira vez, a presidência do CNS para um mandato de quatro anos (1989-1992). Havia chegado a hora de deixar os varadouros sombreados da floresta para explorar o campo minado da política nacional. Tempo de sair da luta local para a luta nacional por seu povo e por todas as populações extrativistas da Amazônia.

As andanças de Júlio alargaram também os seus passos na política partidária. Eleito pelo Partido dos Trabalhadores (PT) em 1996, o seringueiro Júlio, forjado na luta pela sobrevivência e na defesa da floresta, exerceu dois mandatos seguidos como prefeito de Xapuri, a “Princesinha do Acre”, terra dos arrogantes barões da borracha, entre os anos de 1997 e 2004.

Reeleito em 2019 para um segundo mandato (2019-2023) como presidente do CNS, em 2023 Júlio voltou a fazer parte do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDESS), o Conselhão, interrompido durante o mandato do inominável e recriado pelo presidente Lula para, como nos mandatos do governos do PT desde 2003, “debater agendas e temas de interesse dos mais diversos segmentos da sociedade brasileira”.

A exemplo de Chico Mendes, cuja luta em defesa da Amazônia tornou-se uma luta para salvar a humanidade, o seringueiro Júlio Barbosa, 69 anos completados em julho, mais da metade deles dedicados à defesa da floresta, segue firme, “lutando pela floresta em pé, pelo bem-viver dos povos que nela vivem e pelo futuro da própria humanidade”.

Marcos Jorge Dias – Escritor. Perfil produzido para edição 108 da Revista Xapuri, outubro de 2023.